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Devora por dentro


O doutor dizia ser câncer. 


Madalena era uma mulher muito crédula, sendo criada em um lar estritamente religioso, já era de se esperar que fosse assim. A pobre mulher acreditava que uma força invisível e não divina andava junto à sombra de sua filha, Alva.

Pobre mãe! Tentava de todas as formas afastar as pessoas da vida de sua filha acreditando que na mesma habitava um mal irremediável

Alva era uma frágil menina que todos os meses contradizia os diagnósticos e a estimativa do tempo de vida que seus médicos lhe atribuíam.

Neste último aniversário, completava 12 anos, o velho doutor da família, Jean Paulo sorria ao dizer enquanto jogava a pasta com os exames de Alva sobre a mesa, que a filha de Madalena teria apenas umas duas semanas de vida. Todos já se acostumaram com as súbitas melhoras de Alva logo após uma queda na cama.

A menina tinha de todo uma beleza comum, mas algo profundo chamava em seus olhos, o que fazia com que quem conversasse com Alva por muito tempo, olhar sempre para os lados a procura de alguém que não estava lá. Alguns diziam sentir calafrios apenas por ficar ao seu lado.

Madalena já beirava os 45 de idade quando Alva completava doze, no entanto sua expressão era bem mais cansada dando à mãe uma aparência bem mais velha.

Alva dava passos leves de sua cama até a imensa escada caracol da bem fadada mansão que os avós de Madalena havia a deixado de herança. Seus passos pouco se ouviam e com a mãe atarefada com os criados na cozinha escutando alguma velha estação am, a menina aproveitava para observar e imaginar as historias daquela enorme casa onde vivera os seus poucos doze anos de vida.

Os dedos finos e pálidos tocaram o corrimão, se fechasse os olhos era possível ver as pessoas em tempos de outrora subindo e descendo aquelas escadas. O devaneio da garota foi quebrado pelo balançar do lustre cimado ao olho do caracol, pendurado por uma dourada corrente ao teto envidraçado com vitral do que parecia ser são miguel perfurando o diabo.

Os cristais de vidro tilintavam e o lustre como um todo balançava e tal qual começou também parou.

Alva ficou compenetrada em sua observação esperando que algo mais ocorresse por milagre ou bruxaria.

De súbito a garota se vira e a vertigem toma seu corpo que voa para trás com o golpe que tomara no peito. A queda fez um momento parecer uma eternidade enquanto despencava os degraus e sentia seus ossos se partindo.

Com os olhos arregalados, sem poder se mover Alva não escuta mais nada a sua volta. Nem mesmo quando todos da casa vieram para ter cuidado com a menina, nem mesmo quando sua mãe foi aplicar-lhe sermão por ser estabanada e brincar onde não deve.

Passara os últimos dias de cama tentando entender o que a derrubou da escada, o que golpeou seu peito. Seus primeiros dias com doze anos não foram afortunados e Madalena já debatia com a ama de Alva sobre interna-la em algum reformatório para que agregasse boas práticas.

O teto, a janela e seus pés eram as coisas que mais observava enquanto permanecia naquele estado de repouso. Sentia algo que a espreitava naquele momento que a mãe andava para cima e para baixo procurando entre os criados algumas coisas que andavam desaparecendo pela casa.

E sumiu, uma boneca sobre a comoda em frente a cama, assim diante dos olhos de Alva... A menina não gritou, não conseguia, apenas uma lágrima escorreu pelo canto dos olhos. O terror estava nas veias da garotinha enrijecendo suas extremidades, tudo ficou escuro diante da menina que só acordou três dias depois rodeada pelos criados e Madalena.

Todos encaravam a menina como se tivesse voltado do inferno, foi quando percebeu que aquele não era seu quarto, era mais simples e não reconhecia moveis, paredes ou teto.

-Mamãe, o que aconteceu? Ainda acordando a pergunta bateu em todos mas apenas Madalena teve força para responder.

-O doutor disse que foi o câncer...

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